Penitenciária de Tupi Paulista abriga mais de 1,3 mil mulheres (Foto: Reprodução/TV Fronteira)
Mais de 300 presas grávidas ou mães de crianças no Oeste Paulista têm condições de conseguir prisão domiciliar
Nesta terça-feira (6), duas sentenciadas consideradas de alta periculosidade deixaram penitenciária. Gaeco aponta que decisão pode ser uma "porta aberta" para o crime organizado.
Após decisão do Supremo tribunal Federal (STF) que beneficia com prisão domiciliar mulheres presas, não julgadas ainda, grávidas ou que sejam mães de crianças com até 12 anos, ao menos 322 sentenciadas da região de Presidente Prudente podem garantir o direito de deixar a cadeia e cumprir pena em casa. O número representa 23% da população carcerária do Presídio Feminino de Tupi Paulista.
A decisão do STF que concedeu o benefício coletivo pode colocar nas ruas criminosas consideradas perigosas e, inclusive, acusadas de integrarem uma facção que atua dentro e fora dos presídios paulistas. Duas delas já conseguiram habeas corpus na justiça e saíram recentemente da Penitenciária Feminina de Tupi Paulista.
A unidade prisional tem 1375 mulheres presas, das quais 322 podem receber o benefício da decisão do STF. No local 237 mulheres estão presas provisoriamente e aguardam julgamento. Destas, 15 são gestantes, 11 puérperas, 191 têm filhos de até 12 anos e 20 contam com filhos deficientes.
Outras 85 cumprem pena, mas aguardam o resultado de recursos que podem reverter as condenações. Destas, uma é gestante, três são puérperas, 78 têm filhos de até 12 anos e três possuem filhos deficientes.
Operação Ethos
Marcela Antunes Fortuna foi presa no Paraguai em maio do ano passado. A advogada foi acusada de ser chefe de uma célula de uma facção paulista durante a Operação Ethos, deflagrada pela Polícia Civil e Ministério Público Estadual (MPE). Também há a suspeita de que ela tenha participado de um assalto a uma empresa de transportes de valores em que bandidos armados com fuzis roubaram quase US$ 12 milhões. Mesmo com as acusações, ela conseguiu converter sua prisão em domiciliar, pois tem dois filhos, um de dois e outro de nove anos.
A advogada Vanila Gonçales, outra indiciada da Operação Ethos, foi outra beneficiada com a prisão domiciliar. Condenada a 17 anos e dois meses de prisão em regime fechado, a sentenciada também deixou a Penitenciária Feminina de Tupi Paulista para cumprir a prisão domiciliar, já que tem uma filha de oito anos.
O promotor de Justiça do Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco), Lincoln Gakiya, diz que Vanila e Marcela são consideradas pessoas “de alta periculosidade”. “Foi ela [Vanila] quem fez a reptação do integrante do Condep [Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana do Estado de São Paulo] para participar dessa organização criminosa [Sintonia dos Gravatas]. Quer dizer, ela é responsável desde o início pela criação desta célula. E a Marcela, inclusive, estava foragida da polícia. Ficou cinco meses no Paraguai”, suspeita de participar de um crime contra uma empresa de transporte de valores. “Neste período todo ela não estava com o seu filho menor”, aponta.
Abordagem em visitas prisionais
Em entrevista à TV Fronteira, Gakiya destaca que a decisão do STF para cada presa terá de ser analisado “de maneira particular”. “Somente no Presídio de Tupi Paulista nós temos mais de 320 presas que teriam condições, em tese, de receber esse benefício porque têm filhos menores de 12 anos, algumas de altíssima periculosidade, a maioria envolvida com tráfico de entorpecentes e tráfico pesado. Não é aquela situação que a gente viu outro dia de uma grávida com uma pequena quantidade de entorpecente que dormiu com uma criança recém-nascida na cadeia. Então são situações que o crime organizado que vive de oportunidade de negócio, certamente vai se aproveitar”, expõe.
“Tenho notícia em várias unidades prisionais da nossa região de que durante as visitas algumas mulheres têm sido abordadas nas filas, sobretudo aquelas que estão grávidas ou estão acompanhadas de crianças pequenas, justamente para poder ingressar com algum objeto ilícito no presídio, já que elas não fariam jus a qualquer tipo de prisão em flagrante, de prisão preventiva. Então isso é uma porta aberta para que o crime organizado passe a explorar essas mulheres”, conta o promotor do Gaeco.
Ainda foi destacado por Gakiya que “o sentimento é de frustração e muita preocupação”. “Devemos cuidar das crianças até 12 anos, a nossa primeira infância. É claro que estas mulheres também deveriam ter pensado nos seus filhos, pelo menos a maioria delas, antes de ingressarem para o crime organizado e praticarem delitos”, diz.
“Isso realmente vai causar um abalo muito grande nas nossas investigações, porque, como eu disse, o crime organizado já utilizou adolescentes que não eram imputáveis para cometimento de crimes, certamente vai utilizar essas mulheres para o cometimento de crimes”, declara o promotor.
A decisão beneficia ao menos 4,5 mil detentas no país, cerca de 10% da população carcerária feminina, segundo levantamento parcial do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), do Instituto Terra Trabalho e Cidadania (ITTC) e da Pastoral Carcerária Nacional.
Com a decisão do Supremo, cada tribunal terá 60 dias, após a publicação da decisão, para implementar a medida, que valerá também para mães que tiverem crianças com deficiência.
Não poderão deixar a prisão mulheres já condenadas e que cumprem pena; e também aquelas que, mesmo sem condenação, são suspeitas de crimes praticados com violência ou grave ameaça, contra os próprios filhos ou em situações "excepcionalíssimas", a serem justificadas pelo magistrado que negar o benefício.