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Integrantes de facção são condenados a 66 anos de prisão dentro da Igreja Matriz de Mirandópolis

Domingo, 18 Abril 2021 05:33
 

O julgamento de três acusados de matar um outro detento na Penitenciária de Lavínia em 2018, ocorreu no salão de festas paroquial da Igreja Matriz São João Batista, em Mirandópolis, nesta quinta-feira (25).

A utilização de espaços improvisados para atender a população é corriqueira na cidade, até a Prefeitura funciona em um ginásio de esportes há mais de um ano. O julgamento durou cerca de onze horas e a Justiça condenou os três acusados, Marcos Douglas Lino de Araújo e Edgard José de Souza Filho, foram condenados a 24 anos de prisão cada um. Ambos negaram o crime durante todo o processo.

O terceiro acusado, Felipe Furlani, que confessou o crime alegando legítima defesa, foi condenado a 18 anos. O trio é acusado de matar Marcos Caliese Pinheiro por enforcamento dentro de um banheiro do presídio em Lavínia em 2018. O julgamento aconteceu no Salão Paroquial da Igreja Matriz São João Batista, em Mirandópolis, nesta quinta-feira, 25. Os réus permanecem presos, mas ainda podem recorrer da sentença.

Com tantos crimes estampados nos noticiários, a sociedade cobra do poder público repostas e tem no Judiciário a confiança de que a justiça possa ser feita contra aqueles que desrespeitarem o direito do próximo. Em alguns casos, a sociedade pode até se sentir injustiçada por não compreender as decisões dos magistrados, quando determinam posicionamentos contrários ao da opinião pública.

A legislação brasileira ainda é uma zona desconhecida para muitos brasileiros. No entanto, mesmo sem formação na área jurídica, o cidadão pode participar do conhecido Tribunal de Júri Popular e julgar crimes contra a vida, consumados ou tentados, que podem incluir homicídio, infanticídio, aborto entre outros crimes consumados ou tentados. Mirandópolis não tinha se preparado para receber um verdadeiro esquema de segurança.

A quantidade de viaturas não foi divulgada, mas pela cidade a reportagem da Folha da Região, contabilizou mais de oito viaturas além de apoio da Força Tática. Os policiais fortemente armados fizeram um cordão de isolamento no perímetro da Igreja Matriz São João Batista, no coração da cidade.

O Dronepol, o drone da 28˚BPM/1 sobrevoou a área para monitorar a movimentação. O local escolhido para realizar o Júri Popular foi totalmente inusitado. Ao lado da igreja, o recém construído salão de festas, que seria utilizado para reuniões, quermesses e atividades recreativas da igreja, acabou sendo inaugurado pelo Tribunal de Justiça.

O serviço do Júri é obrigatório por lei e recusá-lo por convicção política, religiosa ou qualquer outro motivo, pode acarretar na perda de direitos políticos. A sessão começou no início da manhã e não foi permitida o acesso ao público, o grande galpão deu lugar a cadeiras de plásticos, no palco, destinado para apresentações musicais e missas, foi instalado o conselho de sentença, do outro lado, a presença das partes e testemunhas.

A reportagem da Folha da Região, conversou com uma das sete testemunhas que participou do estranho local do Julgamento. “Eu fiquei surpreso, confesso, porque eu jamais iria imaginar que na sala onde eu fiquei aguardando para ser chamado enquanto testemunha, dividir o espaço com santos enormes na sala, uma bíblica bem na minha frente e vários quadros da Igreja, fiquei pensando que nesse julgamento, Deus estava bem presente”, disparou a testemunha, 54.

Do lado de fora, os fiéis que entravam e saiam da Igreja Matriz, faziam o sinal da cruz, mas com o pescoço voltado para o que estava acontecendo no salão paroquial. Para dona Cátia Andrade, comerciante, que passou rapidamente para fazer uma oração ao Santo Batista, ficou confusa, ao se deparar com tanta polícia praticamente na porta do local sagrado. “Passei por aqui e já chamou minha atenção! Como assim? O que aconteceu na Igreja? Nunca vi tanta segurança assim aqui na cidade, parece coisa de filme né?”, comentou enquanto se despedia da nossa equipe.

Para o Sr. Waldeck Moraes Neves, 68, o susto foi grande porque ao passar pela escadaria da igreja também se surpreendeu com a quantidade de policiais armados na Paróquia. “Quando passei o olho, pensei: Pronto! Só faltava essa! Roubaram a igreja! Esse mundo está perdido! Mas agora que você me contou que se trata de julgamento, até já sei o porquê isso tá acontecendo aqui na nossa igreja… é por causa do Fórum, não é?”, pergunta o empresário.

DOIS FÓRUNS QUE NÃO VALEM POR UM

De fato, Mirandópolis possui não apenas um, mas dois Fóruns de Justiça, que estão envolvidos em um imbróglio burocrático e de planejamento até os dentes. O Fórum antigo, fica a poucos metros da Igreja Matriz São João Batista, construído há mais de 70 anos, não comporta há muito tempo a demanda atual da cidade.

O prédio está cheio de problemas estruturais, quando chove, molha todos os processos, por falta de espaço, a sala onde um dia foi o Tribunal do Júri, hoje está ocupada por mesas de trabalho e pilhas e mais pilhas de processos. A solução foi substituir o prédio antigo, por um novinho em folha. Para isso o Governo do Estado injetou mais de 9 milhões de reais para construir o novo Fórum da cidade.

A obra foi concluída em 2016 mas esqueceram de um detalhe: uma via de acesso para entrada e saída de veículos. E por conta disso até hoje o apelidado, Novo-velhonovo Fórum, nunca foi inaugurado, porque a pedra no caminho, está em definir quem deverá pagar pela obra: o estado ou município?

Segundo o presidente da Ordem dos Advogados em Mirandópolis, Altair Alécio Dejavite, virou uma verdadeira ginástica para dar seguimentos aos ritos processuais e judiciais, algo que para quem mora na cidade se tornou tão corriqueiro, que o espanto, realmente fica para quem é de fora da cidade. “Virou um jogo de empurra, a cidade se desenvolveu, hoje o Fórum antigo não comporta a demanda, além da comarca da cidade, atende também as cidades de Guaraçaí e Lavínia.

Por conta da pandemia, que forçou uma readaptação, foi antecipado um processo de digitalização dos processos, mas outros processos não pararam, como o Julgamento que aconteceu hoje, não foi possível fazer de forma remota, então a decisão foi utilizar mais uma vez o salão paroquial”, conta o presidente. Segundo o advogado, mais de dez sessões de Júri Popular foram feitas ao longo dos anos, e toda vez é necessário especular em qual local será feito na cidade.

“Pelo o que eu fiquei sabendo, os locais mais comuns para realizar de forma improvisada o julgamento em Mirandópolis, foram o salão de festas, o auditório da Câmara de Vereadores e me arisco a dizer que se não houver uma solução, daqui a pouco vão fazer em algum centro comercial, se precisar”, diz. Utilizar espaços improvisados para alocar serviços e até repartições que por algum motivo estão fora de suas sedes, não é algo incomum.

Desde julho de 2019 a própria prefeitura de Mirandópolis funciona em um ginásio de esportes. A mudança forçada aconteceu depois que a Defesa Civil interditou o prédio devido às condições de risco apontadas pelo laudo técnico na época. Por conta do estado precário de conservação do prédio, a sede da Prefeitura e demais departamentos funcionam realocadas em salas apertadas e até embaixo da arquibancada do ginásio.

Em relação ao Novo-VelhoNovo Fórum, ficou para o mês que vem, uma reunião em São Paulo, entre o Tribunal de Justiça e representantes do Poder Judiciário de Mirandópolis, para definir os detalhes do impasse. Uma coisa é certa, a decisão do julgamento coube à justiça dos homens, e lá do alto, independentemente do resultado do Júri, nada escapou do olhar de São João Batista, o Santo do Arrependimento.

 

 

FONTE: FOLHA DA REGIÃO