Relatório da Polícia Federal de Araçatuba mostra que Dilador sabia do esquema de Chinelo

Segunda, 19 Outubro 2020 01:22

DA REDAÇÃO – ARAÇATUBA

Na semana passada, a Delegacia da Polícia Federal em Araçatuba protocolou no fórum da Justiça Federal o relatório final do Inquérito Policial (IPL) 130/2017, referente à operação #tudonosso, desencadeada em 13 de agosto de 2019.

A reportagem de O LIBERAL REGIONAL obteve acesso, com exclusividade, ao documento. No relatório, há transcrições de conversas do prefeito Dilador Borges Damasceno (PSDB) com o principal investigado, José Avelino Pereira, o Chinelo. O processo está tramitando em segredo de justiça.
Nestas conversas, Dilador refere-se ao sindicalista como “mestre” e comunica a liberação de “seu pagamento”, o que demonstra conhecimento do prefeito do domínio de Chinelo sobre as empresas investigadas: Bolívia Comércio de Materiais de Limpeza Ltda – ME e IVVH – Instituto de Valorização da Vida Humana, com as quais o município manteve contrato e outras prestadoras de serviços. Chinelo é citado no relatório como líder da organização criminosa.


As investigações começaram ainda em 2017 após a Polícia Federal receber denúncia apócrifa quanto aos contratos suspeitos firmados entre a administração de Dilador e Edna com empresas ligadas Chinelo. Em março de 2016, em reunião com vários aliados, Chinelo declarou apoio a Dilador, então pré-candidato a prefeito. A partir dali, surgiu uma relação bastante próxima e de negócios envolvendo o município e as empresas ligadas a Chinelo, mas que figuram em nome de laranjas.


Depois de meses de trabalho, inclusive com quebra de sigilo telefônico de várias pessoas autorizada pela Justiça, a Polícia Federal avançou nas investigações, resultando na Operação #tudonosso, com pedidos de mandados de prisão e de busca e apreensão. A operação foi desencadeada no dia 13 de agosto de 2019. Várias pessoas, entre as quais o sindicalista Chinelo, ocupantes de cargos comissionados que foram nomeados por Dilador e outras ligadas às empresas de Chinelo foram presas temporariamente.


Durante a operação, foram apreendidos vários documentos, celulares e outros equipamentos. Equipes da Polícia Federal demoraram meses para periciar o material, assim como conferir documentos, arquivos digitais, diferentes mídias e o depoimento dos envolvidos. Somente após esse exaustivo trabalho, o relatório foi finalizado e encaminhado à Justiça Federal.
PREFEITO
No relatório, a autoridade policial recomenda que os autos sejam submetidos ao crivo do Tribunal Regional Federal, que tem competência para conduzir processo do prefeito Dilador Borges Damasceno (foro por prerrogativa de função). A recomendação da autoridade policial tem por base áudios e mensagens trocados através do aplicativo whatsapp entre o prefeito municipal de Araçatuba e secretários municipais com o líder da organização criminosa, José Avelino Pereira.

Por meio de nomeações feitas por Dilador, Chinelo colocou aliados em pontos estratégicos

No início da administração de Dilador Borges Damasceno e Edna Flor, em 2017, o aliado político José Avelino Pereira conseguiu nomear aliados em pontos estratégicos do governo tucano, como José Cláudio Ferreira (Zé Pera) diretor de Departamento na Secretaria Municipal de Administração; Thiago Henrique Braz Mendes, Diretor de Departamento na Secretaria Municipal de Administração e presidente do Comas; Alexandre Cândido Alves, diretor da Vigilância Sanitária.


Por meio de interceptações telefônicas, a Polícia Federal constatou que os três atuavam dentro da administração na defesa dos interesses de Chinelo e de suas empresas. Thiago Mendes interferia em diferentes áreas para defender os interesses do grupo. Alexandre Alves, ao atender ligações de Chinelo, o tratava como “Patrão”. Zé Pera mostra ser o mais próximo e de mais confiança do líder da organização criminosa, com contatos frequentes.


Diante da omissão de integrantes do governo, o grupo de Chinelo avançou em contratos com a Prefeitura, como a Bolívia e a SEN e depois o IAS. Levantamento feito pela Polícia Federal aponta contratos que chegam a R$ 20 milhões. Além dos contratos diretos com a municipalidade, as empresas ligadas a Chinelo e geridas por laranjas também tinham contratos com o IVVH. Dinheiro público drenado para os cofres do sindicalista. Foi um desses pagamentos que Dilador comunicou ao “mestre”, como o próprio prefeito disse.
Os contratos começaram cedo. Em abril de 2017, foi assinado contrato com a Bolívia Materiais de Limpeza no valor de R$ 504.900,00 mensais. O contrato foi por 180 dias. A homologação foi assinada por Dilador Borges no dia 3 de abril. O relatório da PF chama atenção para algumas peculiaridades desse processo. Na avaliação da PF, no melhor dos cenários, a Bolívia recebeu informação privilegiada dos valores apresentados, entregando a sua proposta no último minuto.
Outros contratos foram firmados, como a SEN e o IVVH. Este último, no valor superior a R$ 8 milhões por 10 meses de contrato, assinado em fevereiro de 2018.

Escândalo do IVVH envolveu vários nomes da administração Dilador

A grande tacada da organização criminosa comandada por Chinelo para avançar sobre o cofre da Prefeitura de Araçatuba foi o IVVH – Instituto de Valorização Humana, uma empresa privada disfarçada em OS (Organização Social) sem fins lucrativos. Tudo feito com conhecimento e até mesmo ajuda de quem deveria zelar pelo patrimônio público. Houve ações de pessoas ligadas a Chinelo que estavam na administração e até mesmo do prefeito Dilador Borges Damasceno e da vice-prefeita Edna Flor, além de secretários.
Criado há vários anos em Ribeirão Preto, o IVVH passou por mudanças e chegou ao comando de Chinelo meses antes do contrato com a Prefeitura. Foram necessários vários arranjos para que que o contrato fosse assinado em fevereiro de 2018, a um custo superior a R$ 8 milhões para aquele ano.
A partir do contrato firmado, começaram as manobras , como a contratação, pelo IVVH, com recursos do município, de várias outras empresas ligadas ao sindicalista José Avelino Pereira, com participação ou conhecimento da secretária Maria Cristina Domingues, do assessor executivo Tiago Mendes e de Silvia Aparecida Teixeira e de outros integrantes do governo.
A Polícia Federal apontou, também, que Thiago Mendes era sócio oculto em escritório de advocacia que prestava serviços para o IVVH e parte do dinheiro voltava para Chinelo. Dentro da administração, como diretor na Secretaria de Administração, Thiago Mendes defendia os interesses de Chinelo, como as conversas que manteve com o chefe de Gabinete Deocleciano Borella Júnior para liberar pagamento pela locação de relógios de ponto.
Em uma das conversas de Thiago com Chinelo, ele revela que Borella teria repreendido a secretária Maria Cristina Domingues sobre o assunto, mas o pagamento só teria sido liberado pela secretária após a intervenção do prefeito Dilador Borges Damasceno.
A vice-prefeita Edna Flor participou de reuniões com o IAS, instituto que foi sucedido pelo IVVH e foram feitas várias cobranças, como a redução de despesas. O relatório da Polícia Federal fala da diametral diferença de tratamento da administração pública com os dois institutos.
Contratos feitos pelo IVVH com outras empresas de Chinelo e que estavam irregulares, foram substituídos dentro da secretaria, que deveria zelar pelo cumprimento dos contratos e glosas de despesas se fosse o caso.
DILADOR E CHINELO
Em conversa do dia 6 de novembro de 2018, Chinelo cobra Dilador. Depois, o prefeito fala “Mestre” e informa que estava liberando pagamento de um mês. Chinelo reforça que são três meses de atraso. A conversa mostra que Dilador sabia do comando de Chinelo sobre as empresas.

Investigação da Polícia FederaL definiu o como funcionava o esquema

Para conduzir os trabalhos, a Polícia Federal definiu como funcionava a estrutura da organização criminosa. Tudo sob o controle de Chinelo e os demais participantes foram divididos em núcleos articuladores (pessoas ligadas a Chinelo e que trabalhavam em cargos comissionados na administração); colaboradores (pessoas ligadas a Chinelo e que atuavam nas empresas) e os facilitadores (pessoas com poder de decisão e atuação na administração).
Os articuladores são: José Cláudio Ferreira (Zé Pera), Thiago Henrique Braz Mendes e Alexandre Cândido Alves.
Os colaboradores: Igor Tiago Pereira, Adriana Bisetto Casarin, Emerson Cardoso, Leandro Ferreira Cassiano da Silva, Gilson Batista Martinez, Marcia Salomé Xavier, João Vitor Custódio Carinheno, Daiana Francielle Gomes, Elói Lourenço Filho, Daniela Amanda Cardoso, Patrícia Batista, Carlos Antônio Carinheno, Mayucow dos Santos Furtado, Tamires Alves Gomes, Paulo Sérgio Moreira, Daniela Gisele Fuser, Wanderson Alves dos Santos, Mirtes Gracindo do Monte, Paulo Eduardo da Silva, Ahmad Nazih Kamar, vulgo Armando.
De acordo com a PF, o núcleo de facilitadores é formado por servidores públicos que integram o alto escalão da administração municipal, possuem estreita ligação com Chinelo, mas não estão subordinados a ele.
Os facilitadores: prefeito Dilador Borges, vice-prefeita Edna Flor, Maria Crista Domingues (era secretária de Assistência Social), Josué Cardoso de Lima (era Secretário da Fazenda) e o vereador Rivael Papinha.

Chinelo e ex-secretários são indiciados criminalmente

No relatório com o indiciamento formal de mais de 20 pessoas, a Polícia Federal evidencia a engenharia do esquema criminoso patrocinado pelos investigados, demonstrando que a organização criminosa se utilizava de seu poder e prestígio políticos para garantir que pessoas do grupo ocupassem estratégicos cargos na administração pública municipal, seja por meio de nomeação de seus correligionários, seja por meio de aliciamento servidores públicos, de forma a garantir a adjudicação de contratos milionários com o poder público e a flexibilização do processo de fiscalização.
No indiciamento a Polícia Federal tipificou ação de cada um dentro do grupo. Quanto ao prefeito, parte do inquérito foi encaminhado ao Tribunal Regional Federal, em São Paulo. Como prefeito, tem direito a foro especial.
Os já indiciados
José Avelino Pereira (Chinelo), líder da organização criminosa
Igor Tiago Pereira
Daiana Francielle Gomes
João Vitor Custório Carinheno
Eloi Lourenço Filho
Paulo Sérgio Moreira
Wanderson Alves dos Santos
Emerson Cardoso
Ahmad Nazih Kamar
Gilson Batista Martinez
Daniela Amanda Cardoso
Dener Barthmann
Carlos Antônio Carinheno
Patrícia Batista
Tamires Alves Gomes
José Cláudio Ferreira (Zé Pera)
Thiago Henrique Braz Mendes
Alexandre Cândido Alves
Maria Cristina Domingues
Josué Cardoso de Lima

 

 

FONTE: LR1 

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